Tarde de 25 de fevereiro de 1980, segunda-feira.
Na Rue des Écoles, uma carrinha de lavandaria conduzida por um motorista ligeiramente alcoolizado, envia, com estrondo, para as urgências do Pitié-Salpêtrière, um homem de 64 anos, inconsciente e sem documentos, que viria a morrer um mês depois, na sequência do evento. Era Roland Barthes, identificado pelo seu colega Michel Foucault. Ambos professores no Collège de France. O caso não parecia relevante, não fosse o pormenor de que (...)
Como édipo, vivemos na ignorância de desejos tão ofensivos à moral, desejos esses que a natureza nos impôs e cuja revelação nos levará, sem dúvida, a preferir desviar o olhar das cenas da nossa infância.
Sigmundo Freud, A Interpretação dos Sonhos
Na região da Fócida há um lugar onde três estradas se encontram. As estradas de Daulis e de Delfos ligam-se à estrada principal, que leva a Tebas. Foi neste lugar que a profecia do oráculo de Delfos pôs em marcha o plano (...)
"Três Mulheres" é um título da Editorial Presença, escrito pela jornalista norte americana Lisa Taddeo, que empreendeu um exaustivo trabalho de pesquisa durante dez anos, viajando pelos Estados Unidos, para recolher a história de três mulheres comuns, em diferentes fase de vida e de diferentes origens sociais. O tema central é o desejo e a sexualidade feminina. Como vivem as mulheres a sua sexualidade? O que desejam? Que fantasias têm? O que esperam?
A autora começa por informar (...)
… para uma análise existencial.
Guimarães Rosa habituou-nos a uma imagética sertaneja cheia de imprevistos sobrenaturais e mágicos, intuídos pela beleza impiedosa da paisagem do Brasil central. Os pequenos gestos agigantam-se na matéria de que são feitos os homens deste lugar. Neste conto particular, o impacto é imediato e concedido pela figura paterna. A sua decisão surpreendente, coloca-nos perante uma angústia da existência que é a angústia do filho. E é sobre esse (...)
2020 foi um ano de muitas leituras adiadas. A promessa de tempo disponível foi gorada por tantas alterações, imprevistos e ajustes, que ainda que quase sempre estivesse a ler mais do que um livro, soube sempre a tempo esquivo. Também não escrevi tanto como gostaria. Este blog fez o seu primeiro ano dia 29 de Dezembro, já mudou de aspeto pelo menos três vezes, e talvez ainda mude outras tantas. Já fico satisfeita se não voltar a apagar publicações inadvertidamente...
Ainda (...)
O ano de 2020 bem podia ter sido escrito por Lewis Carroll, senão vejamos, quantas vezes aconteceu sentirmo-nos cair num buraco escuro para seguir um coelho atrasado? Coelhos atrasados todo o santo ano! E a quantidade de vezes em que encolhemos e esticámos? em tantos sentidos que nem vou enumerar! E quantos dias houve em que acordámos de manhã e sabíamos quem éramos e ao final da tarde já tínhamos mudado tantas vezes que.... Quantas vezes vos ocorreu o pensamento somos todos loucos (...)
Vi Sísifo a sofrer grandes tormentos,
tentando levantar com as mãos uma pedra monstruosa.
Esforçando-se para empurrar com as mãos e os pés,
conseguia levá-la até ao cume do monte, mas quando ia
a chegar ao ponto mais alto, o peso fazia-a regredir,
e rolava para a planície a pedra sem vergonha.
Ele esforçava-se de novo para a empurrar: o suor
escorria dos seus membros; e pó da sua cabeça se elevava.
Odisseia 11. 593-600
Sísifo era um homem astuto. Filho de Éolo, o (...)
Neste final de ano dou por mim a pensar em Proust… em Joyce…, no tempo erodido e na inevitabilidade das escolhas. O tempo não é uma arriba! é uma escavadora de sulcos no córtex existencial. Uma fita magnética linear a revestir as paredes de memórias, em marca d’água, assinada por Khronos. Einstein sabia que o tempo não passava de uma ilusão a criar realidades na (in)consciência.
Verbalmente, o tempo é ter ou haver. Mas não o há que sobeje, nem o tenho em excedências. (...)